quarta-feira, 30 de junho de 2010

"Ele se foi"

A sala de operação era toda cinza, tanto as paredes como o teto. No centro, a mesa cirúrgica sustentava um corpo inerte, anestesiado; os tubos entravam em suas veias bombeando sangue, bombeando vida. Era o que lhe faltava, pois quem se deita sobre aquela mesa definitivamente não tem de sobra.


Médicos prontos, luz acesa, bisturi na mão. Começa então a cirurgia. Os batimentos cardíacos estavam estáveis, então devagar foram abrindo o corpo do paciente. É preciso ser cauteloso, qualquer erro podia ser letal.
“Faça aqui uma incisão, cuidado! Ele está perdendo muito sangue...”


A pressão começou a baixar, os batimentos cardíacos aceleraram, os médicos começaram a suar. A sala cinza viu uma mancha vermelha crescer no ambiente, refletida nos óculos do cirurgião chefe. Aquele barulho ensurdecedor penetrava nos ouvidos de todos aqueles que presenciavam a cena: “PI PI PI”. O coração desesperado tentava bombear algum vestígio de vitalidade para os outros órgãos: “PI PI PI PI PI”. O médico tentava estancar o sangue, o assistente apenas fechou os olhos, o que fazer numa hora dessas? “PI PI PI PI PI PI PI” Eram como os passos da Sra. Morte se aproximando “PI PI PI PI PI PI PI PI PI PI ”
Até que o prelúdio do silêncio tomou conta dos ouvidos de todos na sala: “PIIIIIIIIIIIIIIIIIII”


“Ele se foi.” Disse o médico cabisbaixo. “Um minuto de silêncio, perdemos mais um. Virão outros no lugar, mas nenhum pode substituí-lo. Ele nos fez acreditar por um tempo. Colorido, inocente... Desculpe-me querido!” Olhou para sua equipe e disse num tom monótono “Alguém no mundo acaba de ficar mais incrédulo, acabamos de matar mais um sonho.”


A sala de operação era a mente de um pobre ser por aí. Anestesiado, não sentiu a dor da morte de seu sonho. Amputado deste brilho a vida continuava, porém toda cinza, tanto as paredes como o teto.

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